24.8.10

outra manhã

a baratinação matinal da escova não era tão frenética quanto ontem ou em outras vésperas. nada seria eu acho. o chique-chique mal tirou o gosto sujo de sono da boca. na mesa, já despejando a bebida mexeu na toalha velha e com furos. no mesmo instante, sem licença, o cheiro do café tomava-lhe as narinas. nos dedos muito alongados o ar de desengonço que seria percebido mesmo que não se movimentasse. a asa da xícara era engolida pelos deóides enquanto pegava a faca de cabo branco mas amarelo. coçava com o antebraço a testa umidecida; o calor fugia dos seus poros em forma de letra ó. depois da manteiga, dilacerou o pão com os dentes alvinhos. sentada na sua escrivaninha-mãe a refeição pareceu tola, não queria relamente ter posto aquilo pra dentro. mas seus gestos repetidos trocentos anos a fio ganhavam a perfeição de coisas milvezes esquematizadas dentro de si. acordar, comer, pensar, escrever, dormir. acordar. cuspir.

12.8.10

Bate sandália

Um filme a fez lembrar de uma valsa de 1930. Não pela trilha mas pelas cores desbotadas da fotografia antiga da película. a mistura de tons e formas e texturas a fez lembrar de coisas sutis e sem eventual apreço; ela guardaria também o gosto do sundae de ovomaltine que tomou numa tarde de abril; consigo sem intenção o copinho de plástico já sem o doce e no pé um três por quatro empenhoso. minutos contínuos arrastados num balancê do som da sandália na pedra, chacoalhando pedacinho por pedacinho do dia.

10.8.10

Cadê as notas que estavam aqui?

Quem mais seguia e catarolava com ela no caos, Quem mais com tais maneiras vagalumosas de enxergar o mar enverdecido, a sós com o céu? Ninguém mais sentiu vontade de sair arremedando o vento manso coregosto de araçá. Ninguém se atreveu a pisar em paralelepípedos gaguejantes, na areia fofa. Nem aquele cafuso tupiniquim, nem aquela branca azularada. Quem poderia se encorajar a piscar para o lado, escolher um dos mil e centos e dizer: vem cá, quer ver?! Nem o mais destro, nem a mais canhota, repetitivo, nem a mais anorexa invenção agora seria capaz de indagar as fileiras de olhares coletivos. Há um perigo em mente. Há um perigo e ninguém mais escapa de si mesmo.

9.8.10

Andança

Ando levemente nua e embriagada por onde somente eu quero andar. Foi o que decidi até o final-do-ano. Não vou conversar com muita gente até o final do ano. Só dou olhares a velhos amigos. Permaneço um pouco sem gelo e sem fogo dentro de mim, mas com anotações de geladeira mínimas sobre o universo e dando meu melhor bom dia ao porteiro. Bem assim, 'usando outra vez o sorriso de um menino que dorme com os sapatos novos'.
Só até quando o céu-paço-moita-vento-que-balança-xilindró-muié-a-saia-peteca-cão.